Narcisismo e vazio psíquico

Foto Autor Post por Daniele Passos

Para falarmos sobre o narcisismo na atualidade, não podemos deixar de voltar as primeiras relações objetais, mãe-bebê. A frase tão famosa de Freud “o bebê é a sua majestade”, ainda hoje repercute sobre o pensar nos cuidados maternos iniciais. É sabido que o investimento materno é de suma importância para o desenvolvimento psíquico humano.

 

Esta fase narcísica inicial, onde o bebê se imagina criador-criatura e vai com o passar do tempo se diferenciando como sujeito através do olhar materno será seu registro do mundo. André Green, em seu livro “ Narcisismo de Vida, Narcisismo de Morte”, 1988, fala sobre o conceito da mãe morta, não morta realmente, mas psiquicamente morta, onde não consegue investir em seu bebê. Meu trabalho de conclusão do curso de especialização em Neuropsicologia da UNIARA, 2015, teve como tema “ A mãe depressiva e o desenvolvimento neuropsicológico da criança. Estudo este que confirma a importância e as consequências dos cuidados iniciais.

 

Assim, o que vemos nos adolescentes e adultos de hoje, são pessoas desinvestidas de si mesmas. A parte narcísica, digamos, saudável, onde a auto aceitação e o auto conceito positivo, toma o lugar de um vazio psíquico imensurável.

 

Na falta de um EU forte, sonhador e desejante, vivemos a angústia de não se enquadrar num modelo estético, econômico, social e familiar veiculado pela mídia. Temos a construção subjetiva de felicidade como algo que deve ser acoplado ao ser, como uma roupa nova, um adorno, um laptop, e deixa de lado a verdadeira importância da vida, que são as relações afetivas e edificantes.

 

O modelo “ostentação”, fitness, empreendedor, competente, grifes, sarado, saudável, feliz e o número de curtidas recebidas em redes sociais, são o termômetro da sociedade que estamos vivenciando. Onde a satisfação pessoal tem que ser plena. Caso contrário, vive-se num vazio. Contardo Calligaris escreveu um artigo há algum tempo atrás no jornal “ Folha de São Paulo”, dizendo que as pessoas deveriam escolher por desejar “ uma vida interessante”, ao invés de uma “vida feliz”. Pois uma vida interessante inclue todas as perdas, alegrias e tristezas. Ou seja, contempla nossa humanidade em todas as suas facetas, a gente gostando, ou não.

 

Quando criança-pobre, chora-se por não ter roupas; quando adulto-rico, chora-se por não estar feliz mesmo tendo roupas soterradas no guarda-roupa com etiquetas. O que se falta, então? De que vazio falamos? Falta-se mente! A mente é construída por afetos, pelo olhar cuidadoso da vida, da mãe vida viva e não uma mãe vida morta.